Hoje perguntei ao meu Pai: “Pai, o que em mim lhe
incomoda?”. Ele me fitou nos olhos. Com medo de deixar-lhe desajeitado,
completei em tom de brincadeira: “Seja honesto Pai, não é todo dia que dou
oportunidade de alguém me criticar.”
Ele riu, meneou a cabeça, tornou a fitar meus olhos e disse,
com sua voz em tom grave, que costumam elogiar como voz de locutor: “A única
coisa que reclamo de você, é que embola as ferramentas no lugar de passar, e quando
acaba um serviço, em vez de recolher as ferramentas, vai tomar agua ou
descansar, sendo que só acaba um serviço quando as ferramentas estão em seus
devidos lugares.”
Eu parei, pensei e sorri. Tantas coisas eu pensei que ele
poderia reclamar, poderia reclamar pela minha mania de cantar excessivamente
alto e em quantidade, reclamar que nas últimas semanas tenho usado o celular no
trabalho, reclamar que vou embora cedo demais, reclamar que leio livros na
borracharia, o que convenhamos não ser um lugar ideal para tal façanha. Poderia
reclamar dos meus gastos excessivos no shopping, ou de comprar livros
desenfreadamente a ponto de ficar sem espaço para guarda-los. Poderia reclamar de
minha ignorância, ou da minha mania de querer entender todos e ter compaixão demais,
reclamar do meu desinteresse de seguir a carreira militar, reclamar do meu
quarto bagunçado, do meu sentimentalismo excessivo e das minhas filosofias
mirabolantes, e até da minha mania de falar sozinho, e em pior das hipóteses,
pedir para eu não escrever na borracharia quando houvesse alguém por perto,
porque é algo bem atípico, mas ele só disse que eu devia me organizar melhor.
Paro agora e penso. Por quantas vezes achei que fazia as
coisas errado, quantas vezes me senti sozinho e abandonado no porto. Quantas
vezes me joguei no buraco para que nem o vento me atingisse, e hoje ver que o
homem que me criou, o homem que tantas vezes me ocultei dele só quer que eu
seja mais organizado na borracharia!
Por quantas vezes eu chorei querendo amor, por quantas
vezes? E o amor estava aqui.
É bom cara, saber que apesar de tudo que você faz, apesar
dos erros, dos acertos, dos exageros e das minimizes, você tem espaço para
alguém, espaço demasiadamente bom para que alguém que vive no extremo da impaciência
reconheça seu valor.
E no final, depois de todo o pensar eu disse: “Fala sério,
estou sem dinheiro”.
Papai parou, olhou para mim, meneou a cabeça novamente,
riu seu sorriso amarelado por 43 anos de cigarro e disse: “É só isso mesmo.
Você é um bom filho”.
Eu chorei. Ele não viu, mas eu chorei.
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