quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

A vida

A vida que vai, a idade que chega, as consequências que se amontoam com o passar dos anos. Os jovens veem os velhos carregar o peso de suas extravagancias de uma vida sem limites, mas por sorte ou revés, não lhes intimida viver cada minuto, como se fosse o último.

Regrar o agora para um amanhã indolor ou aproveitar o dia de hoje intensamente, e ser insano? Deixar as consequências para ser pesadas quando chegarem, se chegar?

Dias atrás, conheci um homem que se descobriu hepático. Ele disse que a doença é fruto de complicação de uma tatuagem, no braço, feita 33 anos atrás, em uma época que era detento penitenciário. O desenho era comum, que não me encantou os olhos, não me pareceu ter qualquer sentido, estampado ao fundo de uma pele dourada pelos bons anos do árduo trabalho braçal, debaixo do sol que ora era quente por demais, ora nem chegava a acordar.

Enquanto ele relatava sua história, não pude captar arrependimentos por parte dele. Pelo contrário, ele transparecia conformidade conforme tudo aquilo que vivia. Fiquei imaginando o quanto ele deve ter ostentado aquelas imagens em suas noitadas pelos bares e cabarés, quantas mulheres aquela marca artificial em seu corpo não foi capaz de trazer-lhe. Quanta curtição algumas gotas de tinta não o trouxe por anos, e hoje, ameaça sua vida. Como ele mesmo se julga, “estou no corredor da morte”. Não é mais velho do que 55 / 56 anos.

As pessoas ouvem sua história e em sua ausência comentam que o homem é um coitado. Eu queria que alguém perguntasse a ele: “Vê problema em morrer nessa idade?”. Questiono se ele quer mesmo morrer jovem, mas talvez ele esteja pronto para lidar com a auto perda.

Desde que sabemos aproveitar nossos momentos de glória, e estejamos em busca da imortalidade de nossas experiências e lembranças das noites bem dançadas, sem nunca esquecer de que somos protagonistas do nosso destino todos os dias, à todo e qualquer tempo, independente do espaço, não vejo problemas em enfrentar no futuro as consequências de um passado agitado.

Nós sofremos porque encaramos os dias como sofrimento. Somos auto programados para pensar que a dor física causada por uma doença é sofrível, e acreditamos sempre que a morte é o fim de tudo. Estamos ligados ao pensamento do ciclo, que aqui se inicia e termina. Esquecemos no decorrer dos dias, das promessas de um tempo melhor que aprendemos na igreja, e do conceito imortal do conjunto alma/espirito. Tornamo-nos íntimos do ciclo comum do tempo. Da história que se repete. Sabemos que devemos ter fé nas divindades, mas queremos ser heróis de nossas próprias existências. E sempre querer dar uma ajudinha pra Deus.


Não se pode culpar os velhos pela juventude bem vivida, do modo certo ou errado, e nem querer que os jovens amansem sua adrenalina para que sejam velhos saudáveis. Temos é que mudar o modo de enxergar as coisas, priorizando a felicidade, a vida exuberante, o modo chique de ficar acordado durante a noite, sem querer cobrar do outro o peso do arrependimento. Só podemos viver. 

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