sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Pare de catar trágedia

Outro dia tive uma discussão séria lá em casa. O motivo? “Catação” de tragédias. Estavam falando da recém ocorrida Marcha para Satanás e comentando sobre um vídeo que fora compartilhado na Rede. Aos comentários de tudo que andei ouvindo sobre tal movimento, pessoas se diziam entristecidas com a realização da marcha, achavam aquilo uma afronta à seus costumes e crenças, diziam até que era um ato criminoso num estado formado em sua maioria por religiosos. Mas uma coisa me chamou a atenção: mesmo doídas com o fato, elas não deixaram de compartilhar o vídeo, de falar no assunto, de exprimir suas opiniões- que em sua maioria era carregada de ódio e condenações.

Foi por isso que eu discuti: se algo não é bom, porquê perder tempo midiatizando aquilo? Se aquilo é ruim, passa uma sensação desagradável, porquê ficarei falando daquilo e levarei tais sensações para aqueles a quem amo?

Como Cristão, entendi que a marcha em si já é um dos fatos nada agradáveis que o livro de Apocalipse já nos adiantou que aconteceria. O que me resta diante disso? Pegar minha bíblia, fazer uma oração e me cobrir com a armadura de Deus (Efésios 6.10-19). Me resta depois, seguir o mandamento “não julgaras”. E lembrar do livre arbítrio. Pronto. Se eu não acreditar que o mal pode me alcançar e buscar minha proteção, com fé naquilo que acredito, o que mais fazer?

A marcha é um mero exemplo da catação de tragédias com qual me irei. Tens percebido de que quando ligas a televisão, o rádio do carro ou abre o Facebook, os fatos noticiados são sempre desagradáveis? De um tempo pra cá a palavra “MANCHETE” começou a dar repulsa.  Tragédia de Mariana, atentado em Paris, corrupção, desastres causados pela chuva, acidentes de carro -  a cada feriado eles fazem uma estatística de quantas pessoas morrem e ainda comparam com o mesmo período em anos anteriores-, tráfico de drogas, assalto...  Estamos falando de um sem-número de pessoas que passaram a compartilhar o negativo. A tragédia. Parecem até querer saber quem sabe mais tragédia que o outro.

Outro dia, no meu Pai, estavam conversando dois caras. Típicos brasileiros da casa dos 40, membros da Família Tradicional Brasileira (assim fica mais fácil). Um contava pro outro do assassinato que teve no bairro: “E aí, o cara entrou cercou a moto do outro, deu X tiros...”, o outro interrompeu: “... no meu bairro faz uns dois anos, mataram um cara assim e assim, com 20 tiros de um 38...”, o outro retoma em voz alta a fala embargada: “.... esse lá era uma ponto 40...”, e ficaram nessa disputa de quem contava uma tragédia mais bonita, com mais número de tiros, com mais dramatização. E eu, no meu canto, fiquei pensando: o que eles ganharam com esse diálogo? Não que uma conversa com alguém tenha de sempre lhe trazer uma recompensa, mas, o que de bom eles levaram para si ou deixaram no mundo com aquela conversa?

Como um poeta, um sonhador, um utópico ando acreditando num mundo mais humanizado. E acredito que é uma quase-obrigação parar de catar tragédia. E não que não falar de tragédia não fará com que não aconteça. O ponto é que para que falar de algo que não traz benefícios práticos saudáveis de forma alguma para a nossa vida, as relações, a sociedade em si?

Qual o benefício de abrir um jornal logo cedo ler as maiores tragédias do dia anterior? Ficar questionando quem sofreu um acidente ou foi vítima de assalto, como tudo aconteceu? Vou além e digo: do que ganham as pessoas ficarem cochichando da filha da vizinha que tá grávida?

Vamos parar de falar de coisas ruins. Pessoas serão assaltadas todos os dias (infelizmente), e mais do que vomitar nos meus amigos do Facebook um textão questionando o papel do Estado na não-prevenção de roubos, acho mais válido, cadastrar uma petição em comunidades online, como a Avaaz, convidando as pessoas a se unirem para pressionar as camadas de poder uma tomada de atitude. Mais útil, não acha?

O estupro, a morte, o tráfico de drogas, a tortura, o sequestro são fatos que vão acontecer, e a partir do momento em que nossas ações não possam ser capazes de evitar a reincidência dessas tragédias, ou ajudar de alguma forma, para que entupir a cabeça das pessoas, e as nossas, com informações ruins?


Não gaste seu vocabulário falando algo triste, contando uma tragédia, rindo da desgraça alheia. Não gaste seus neurônios-que morrem e não voltam- gastando tempo propagando o ódio –julgando alguém, mesmo que o que o outro faça seja o oposto daquilo que acredita. Não compartilhe o vídeo do policial batendo no marginal. Desligue a TV na hora do jornal, e procure se concentrar naquilo em que é falho, ou busque uma confraternização, ou vá para a internet ler sobre a importância das abelhas no equilíbrio ambiental. Não perca o tempo em família contando coisas que o vizinho disse, ou sendo negativo, pessimista, verdadeira peça triste. Se você costuma ler algum jornal que usa suas páginas para relatar crimes e coisas ruins, troque de jornal ou pare de ler jornal. Se a turma do trabalho fica trocando as tragédias que cataram, tente trocar de assunto, ou deixe-os em seus cantos, e procure catar flores e dividi-as com alguém. Pare de acreditar que é importante falar da realidade: você não precisa de assistir novelas que vão ensinar-lhe a trapacear, táticas de estupro silencioso ou qualquer coisa. Você precisa é abrir espaço em você para que a bondade propague e aí, você vai entender que a maldade mora muito mais em seu interior e nos seus olhos, do que no núcleo do mundo.

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