Outro dia tive uma discussão séria lá em casa. O motivo?
“Catação” de tragédias. Estavam falando da recém ocorrida Marcha para Satanás e
comentando sobre um vídeo que fora compartilhado na Rede. Aos comentários de
tudo que andei ouvindo sobre tal movimento, pessoas se diziam entristecidas com
a realização da marcha, achavam aquilo uma afronta à seus costumes e crenças,
diziam até que era um ato criminoso num estado formado em sua maioria por
religiosos. Mas uma coisa me chamou a atenção: mesmo doídas com o fato, elas
não deixaram de compartilhar o vídeo, de falar no assunto, de exprimir suas
opiniões- que em sua maioria era carregada de ódio e condenações.
Foi por isso que eu discuti: se algo não é bom, porquê
perder tempo midiatizando aquilo? Se aquilo é ruim, passa uma sensação
desagradável, porquê ficarei falando daquilo e levarei tais sensações para
aqueles a quem amo?
Como Cristão, entendi que a marcha em si já é um dos fatos
nada agradáveis que o livro de Apocalipse já nos adiantou que aconteceria. O
que me resta diante disso? Pegar minha bíblia, fazer uma oração e me cobrir com
a armadura de Deus (Efésios 6.10-19). Me resta depois, seguir o mandamento “não
julgaras”. E lembrar do livre arbítrio. Pronto. Se eu não acreditar que o mal
pode me alcançar e buscar minha proteção, com fé naquilo que acredito, o que
mais fazer?
A marcha é um mero exemplo da catação de tragédias com qual
me irei. Tens percebido de que quando ligas a televisão, o rádio do carro ou
abre o Facebook, os fatos noticiados são sempre desagradáveis? De um tempo pra
cá a palavra “MANCHETE” começou a dar repulsa.
Tragédia de Mariana, atentado em Paris, corrupção, desastres causados
pela chuva, acidentes de carro - a cada
feriado eles fazem uma estatística de quantas pessoas morrem e ainda comparam
com o mesmo período em anos anteriores-, tráfico de drogas, assalto... Estamos falando de um sem-número de pessoas
que passaram a compartilhar o negativo. A tragédia. Parecem até querer saber
quem sabe mais tragédia que o outro.
Outro dia, no meu Pai, estavam conversando dois caras.
Típicos brasileiros da casa dos 40, membros da Família Tradicional Brasileira
(assim fica mais fácil). Um contava pro outro do assassinato que teve no
bairro: “E aí, o cara entrou cercou a moto do outro, deu X tiros...”, o outro
interrompeu: “... no meu bairro faz uns dois anos, mataram um cara assim e
assim, com 20 tiros de um 38...”, o outro retoma em voz alta a fala embargada:
“.... esse lá era uma ponto 40...”, e ficaram nessa disputa de quem contava uma
tragédia mais bonita, com mais número de tiros, com mais dramatização. E eu, no
meu canto, fiquei pensando: o que eles ganharam com esse diálogo? Não que uma
conversa com alguém tenha de sempre lhe trazer uma recompensa, mas, o que de
bom eles levaram para si ou deixaram no mundo com aquela conversa?
Como um poeta, um sonhador, um utópico ando acreditando num
mundo mais humanizado. E acredito que é uma quase-obrigação parar de catar
tragédia. E não que não falar de tragédia não fará com que não aconteça. O
ponto é que para que falar de algo que não traz benefícios práticos saudáveis
de forma alguma para a nossa vida, as relações, a sociedade em si?
Qual o benefício de abrir um jornal logo cedo ler as
maiores tragédias do dia anterior? Ficar questionando quem sofreu um acidente
ou foi vítima de assalto, como tudo aconteceu? Vou além e digo: do que ganham
as pessoas ficarem cochichando da filha da vizinha que tá grávida?
Vamos parar de falar de coisas ruins. Pessoas serão
assaltadas todos os dias (infelizmente), e mais do que vomitar nos meus amigos
do Facebook um textão questionando o papel do Estado na não-prevenção de
roubos, acho mais válido, cadastrar uma petição em comunidades online, como a
Avaaz, convidando as pessoas a se unirem para pressionar as camadas de poder
uma tomada de atitude. Mais útil, não acha?
O estupro, a morte, o tráfico de drogas, a tortura, o
sequestro são fatos que vão acontecer, e a partir do momento em que nossas
ações não possam ser capazes de evitar a reincidência dessas tragédias, ou
ajudar de alguma forma, para que entupir a cabeça das pessoas, e as nossas, com
informações ruins?
Não gaste seu vocabulário falando algo triste, contando uma
tragédia, rindo da desgraça alheia. Não gaste seus neurônios-que morrem e não
voltam- gastando tempo propagando o ódio –julgando alguém, mesmo que o que o
outro faça seja o oposto daquilo que acredita. Não compartilhe o vídeo do
policial batendo no marginal. Desligue a TV na hora do jornal, e procure se
concentrar naquilo em que é falho, ou busque uma confraternização, ou vá para a
internet ler sobre a importância das abelhas no equilíbrio ambiental. Não perca
o tempo em família contando coisas que o vizinho disse, ou sendo negativo,
pessimista, verdadeira peça triste. Se você costuma ler algum jornal que usa
suas páginas para relatar crimes e coisas ruins, troque de jornal ou pare de
ler jornal. Se a turma do trabalho fica trocando as tragédias que cataram,
tente trocar de assunto, ou deixe-os em seus cantos, e procure catar flores e dividi-as
com alguém. Pare de acreditar que é importante falar da realidade: você não
precisa de assistir novelas que vão ensinar-lhe a trapacear, táticas de estupro
silencioso ou qualquer coisa. Você precisa é abrir espaço em você para que a
bondade propague e aí, você vai entender que a maldade mora muito mais em seu
interior e nos seus olhos, do que no núcleo do mundo.
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