terça-feira, 22 de março de 2016

Ao senhor Caio Fernando Abreu

Belo Horizonte, 22 de março de 2016.
Querido Caio Fernando Abreu,

Situação financeira. OK

Desempenho acadêmico. OK

Vida profissional. OK

Convívio familiar. OK

Relações afetivas. OK

Tá tudo certo, Caio, mas eu continuo chorando. E eu não sei o porquê. Sabe, Caio, tá tudo no lugar. Parafraseando Pitty Leone, uma cantora de meu tempo que se tornou referência intelectual pela sua rica produção artística, “eu tô exatamente onde eu queria estar”, e não falo isso com orgulho, Caio, mas com pesar: será que isso era de fato ‘onde eu queria estar’?

Fui outro dia comprar um livro seu na livraria. 50 reais. Olhei bem a vendedora. Ela me olhou. Deve ter imaginado que eu não tinha condições de comprar; condições eu tinha, só achei caro. E me arrependi: eu ando precisando de algo para me segurar, Caio. Preciso de algo para me segurar, para fazer de base. Algo para chamar de meu e colocar ao lado do peito e sentir a sonoridade deliciosa e rica e inspiradora do silencio. Eu sei que você foi jornalista, cronista, escritor e filosofo, mas, me diga: sabe me dizer o que eu tenho? Se é coisa que se cura com remédio ou com abraço? Ou não se cura?

Caio, escrevo a você pois sei que acredita nas minhas dores, e não chama de drama. Escrevo na esperança de um sinal. De um “continue” ou de um “pare”. Não está sendo fácil. E eu sei que não estou bem pois ando para baixo, fazendo os mínimos esforços e sentindo o máximo de desgaste físico possível. Minhas tardes têm dado crédito a minha existência: são palcos de futilidade e vagabundagem do nível pior que existe. Tenho sido do tipo que dorme pro tempo passar e chora por ter perdido tempo e reclama por ter ainda tanto tempo a perder. Será que a vida se cansou de mim, Caio? Venceu meu tempo e o guarda-roupa que não se mantem arrumado é apenas um sinal de que é o fim dos tempos e eu não consegui entender isso ainda?

Talvez eu tenha errado em sonhar, Caio. Devia ter seguido os rumos da vida, e ter sido menos radical quando decidi abandonar o álcool e as curvas de insanidade. Talvez meu lugar seja pulando entre os estranhos do Festival de São Patrick e não sentando num show apenas aplaudindo. E eu que sempre achei que era dono de mim, virei plateia de um mundo que se quer me enche os olhos, e os elogios se tornaram os mesmos, e a saudade se tornou cumprimento, e as semanas começaram a passar rápido e ainda mantivemos a esperança de que a vida passaria devagar.

Eu preciso que me ajude a me encontrar, Caio. Encontrar meu caminho, minha luz, meus sonhos. Preciso de uma parada obrigatória logo a frente. Longa. Sem pressa. Tranquila. Eu preciso recomeçar, Caio, mas a vida me espera logo ali fora. A vida me esperará quando eu minimizar essa janela, e eu terei de entregar resultados às essas expectativas que eu lutei para que esperassem de mim, mas não sei se serei capaz de entregar.

Vou tentar sobreviver.

Espero que esteja bem, Caio.

Dê notícias de si.
Com amor,

Daniel Lucas Batista de Assis.

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