Querido
Caio Fernando Abreu,
Boa noite!
Como
andas meu amigo? Estou com saudades tuas, Caio.
Outro
dia abri um livro teu e me matei duas vezes e ressuscitei outras sete lendo
Cartas Para Além dos Muros. Que conforto ter acesso a algo seu, Caio.
Uma
amiga minha visitará o Rio Grande do Sul em breve, Caio, e encomendei-lhe uma
visita a sua casa. Pelo menos passar pelo portão, ver se ainda sobra algo do
seu jardim, tentar extrair alguma energia de sua antiga morada. Tenho
necessidade de pessoas e suas memórias, Caio.
Deixe-me
contar uma nova: sabe a escola em que estou trabalhando? O contrato está em
fase final.
Imagine
como estou, rapaz. Mal dormi esses dias. Só de pensar em não ver mais aqueles
meninos e nem me aproximar deles como professor, o coração já aperta. Não sei
se já ouviste falar de Confúcio e sua famosa frase sobre a escolha do trabalho*,
mas nos últimos dias tenho me sentido assim. Chego no trabalho e os minutos
correm. O dia de dar tchau vem se aproximando e como eu poderei olhar aqueles
meninos nos olhos e dizer que não volto mais? E eu nem digo que isso seja
dramático para eles, mas para mim é. Como assim não serei mais professor deles,
e eu nem falei para eles ainda que eles são bons e tem futuro. Eu ainda nem
ensinei o essencial que todos os alunos do sexto ano deve saber, nem mandei os
do sétimo ingressar num curso no SENAI.
O
tempo passou rápido Caio. E eu fui feliz. Mesmo com muitas bads, algo que foi
diagnosticado como uma depressãozinha, perdas, lágrimas, sermões, acertos e
erros: com tudo isso eu fui feliz. Saber que fiz parte de seis meses da
história de quase cem seres-humaninhos foi bom. Quero sim que eles me
cumprimentem na rua, e talvez eu pague casquinha para algum que coincidir de
entrar na sorveteria enquanto eu estiver por lá. Se eu souber de um jogo novo,
vou mandar para os meus alunos do sétimo ano, e finalmente aceitarei os
convites que acumularam na minha caixa de convites do Facebook.
Na minha
despedida, verei se levo um texto motivacional da internet escrito por
pedagogas com algumas adaptações minhas. Tentarei citar você e Carpinejar no início,
colocar quem sabe algo de Fernando Pessoa e a luminosidade de Cecília Meireles.
E vou colocar alguma coisa forte de Paulo Coelho ou Augusto Cury no final: fará
bem. Eles são jovens. Eles acreditam.
Quando
eu acordar na segunda-feira e não tiver mais de ir dar aulas, Caio, vou ficar
na cama deitado a manhã toda. Quatro horas e meia de luto. Depois vou levantar,
e apagar, aos pouquinhos, os arquivos deles do meu computador, laptop, hd
externo e pen drive, e do Google Drive também. Não posso esquecer das coisas
deles no meu e-mail.
Bom,
fique bem Caio. Espero que esteja bem e que estejam te deixando em paz com jardim
e flores, e que te estejam dando cigarros suficientes. Não esqueça de mandar
notícias suas.
Um
abraço, meu amigo.
Com
todo o meu amor,
Daniel
Lucas.
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